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sexta-feira, 5 de junho de 2009

Juventude e o Meio Ambiente


Dia 05 de junho - Dia Mundial do Meio Ambiente


A idéia deste texto é traçar um breve balanço das ações na área de Juventude e Meio Ambiente, trazendo alguns olhares sobre os avanços construídos e as perspectivas visíveis para os próximos anos. Portanto, o texto reflete visões pessoais de alguém envolvido diretamente na concepção, implementação e avaliação de políticas nesta área, não sendo portanto um balanço "neutro", nem tão pouco isento de valores e princípios de uma Educação Ambiental dita crítica, emancipatória e popular e de uma visão de Juventudes conjugada no plural e reconhecida com legitimidade e respeito.

Caminhando e cantando...

Traçar um balanço de ações na área de Juventude e Meio Ambiente exige que olhemos para o passado, percebendo a construção histórica da luta ambientalista no Brasil - os avanços, conquistas, lacunas - e como a atual geração "jovem" percebe e se insere num meio ambientalista já caracterizado por uma boa diversidade de iniciativas e idéias.

De fato, quem passa a se auto-reconhecer como sendo um novo ambientalista (seja um jovem de idade ou jovem há mais tempo) percebe um cenário cujos avanços são inegáveis e precisam ser reconhecidos e identificados. A título de ilustração, listarei alguns deles:

• Arcabouço legal constituído (legislações, resoluções, etc), especialmente nos âmbitos federal e estadual.
• Instituições atuantes e organizadas (Sistema Nacional de Meio Ambiente - SISNAMA), ainda que com carências e necessidades diversas.
• Aporte técnico disponível (diretrizes, normas, orientações técnicas, publicações), em diversas áreas do campo ambiental.
• Presença de recursos humanos (técnicos, profissionais) em atividade, ainda que com lacunas identificadas em diversas áreas da EA, como por exemplo as áreas de avaliação, indicadores, juventude, centros de educação ambiental, dentre outras.
• Maior presença da EA nos meios de comunicação, na mídia, internet, com ampla disponibilidade de informação, ainda que passível de filtros e que muitas pessoas não tenham acesso ao computador.
• Oportunidade de formação na área, para além dos espaços "formais" da EA (escola, universidade, colégios técnicos) com considerável avanço em experiências não-formais da EA (Coletivos Jovens, Coletivos Educadores, Centros de Educação Ambiental - CEAs, Redes de EA, ONGs, Institutos, Fundações, movimentos, internet, mídia, projetos, etc).

Todos estes avanços são frutos de lutas e esforços de diversas pessoas que levantaram (e continuam levantando) a bandeira ambientalista desde o final dos anos 60 no Brasil, e com mais força a partir dos anos 70 e 80. Nestas épocas a situação era bem diferente de hoje - governo militar, repressão, descrença da sociedade com relação à questão ambiental, baixa institucionalização do tema, carência de recursos, etc.... A situação atual é por um lado mais diversificada, com os diversos avanços já mencionados (dentre muitos outros), mas é também mais complexa e mais grave. A questão das mudanças climáticas vem ganhando espaço nas agendas nacionais e mundial, e vai se tornando sem dúvida na "bola da vez" da questão ambiental global.

Neste rápido retrospecto, a contribuição de sujeitos jovens à este processo de construção da questão ambiental no Brasil é inegável, e se deu não no interior de organizações nacionais de juventude, mas sim a partir de sujeitos jovens, ainda pouco identificados como "Juventudes", mas com a energia e a vontade deste segmento em transformar, lutar, denunciar, revolucionar a situação que se vislumbrava na ocasião.

Portanto, os jovens estiveram presentes neste processo histórico, ainda que não se reconhecessem ainda como um segmento de juventude, muito menos hasteando a bandeira própria deste segmento. Este talvez seja um diferencial da situação atual do tema, como veremos a seguir.

Seguindo a canção...

Feito este rápido retrospecto, passemos a olhar para o tema na atualidade, situando-a num contexto caracterizado por:

• início da primeira gestão do governo Lula (2003), quando inúmeras expectativas dos segmentos ambientalista e de juventude eram depositadas no novo governo que se iniciava.
• atraso brasileiro com relação à institucionalização da pauta "juventude", marcado pela ausência de políticas e instituições federais de, para, com este segmento.
• Desinteresse dos jovens brasileiros pela questão ambiental, não figurando-se sequer entre os dez principais temas de interesse ou problemas

Portanto, percebe-se que o quanto a área - Juventude e Meio Ambiente - é recente e carente de referenciais teóricos, político-institucionais, orçamentários, etc.

Ainda que houvesse iniciativas na área antes de 2003, não há dúvida que o processo de mobilização e organização da I Conferência Nacional Infanto-Juvenil pelo Meio Ambiente (CNIJMA) foi uma espécie de "divisor de águas" na temática. Por um lado alavancou a proposta dos Coletivos Jovens de Meio Ambiente (CJs) pautada nos princípios de: Jovem educa Jovem; Jovem escolhe Jovem; e Uma geração aprende com a outra; catalisou a participação de estudantes das escolas (de 5a a 8a séries) nos processos de conferências de meio ambiente nas escolas; e propiciou um trabalho coletivo e articulado entre diversas instituições da área de educação ambiental.
A 1a. Edição da Conferência, por sua vez, alavancou diversos projetos e ações que procuraram dar continuidade às expectativas geradas pelas conferências de meio ambiente realizadas nas milhares de escolas participantes - Com-vidas, CJs, formação de professores, projetos e ações de EA...

Além da Conferência também merecem destaque outras iniciativas desenvolvidas e/ou apoiadas pelo Órgão Gestor da Política Nacional de Educação Ambiental (MMA e MEC) como a 2a edição da Conferência Nacional Infanto-juvenil pelo Meio Ambiente (2005/2006), o Programa "Juventude e Meio Ambiente", os Coletivos Jovens de Meio Ambiente (CJs), a Rede da Juventude pelo Meio Ambiente e Sustentabilidade (REJUMA) e o Projeto Geo Juvenil Brasil. Todas elas sendo desenvolvidas a partir de 2003, procurando catalisar e criar sinergia com iniciativas já existentes no país, porém pouco articuladas, localizadas e desconexas. De um modo geral essas iniciativas enunciadas trouxeram importantes inovações estabelecendo algumas perspectivas interessantes para a área de Juventude e Meio Ambiente no país:

• Trabalham numa perspectiva do jovem como sendo agente de transformação social, e, portanto, ambiental, com inserção e articulação bem além dos espaços escolares, envolvendo uma considerável diversidade de organizações, movimentos e coletivos de juventude (skatistas, surfistas, agricultores, estudantes, escoteiros, trabalhadores, partidos políticos, movimentos sociais, religiosos, empresários, educomunicadores, etc).
• Jovem como cidadão que atua politicamente no mundo, portanto, com capacidade de definição dos seus próprios objetivos, metas, rumos, caminhos, e com habilidade suficiente para articular, criar, implementar e avaliar seus próprios projetos e ações. Essa perspectiva vai além do tão falado "protagonismo juvenil", porque coloca efetivamente os sujeitos jovens no centro da tomada de decisão na definição dos seus rumos, não sendo apenas o "público-alvo" deste ou daquele projeto.
• Práxis de três princípios inovadores: a) jovem educa jovem, assumindo claramente o papel protagônico dos jovens como sujeitos sociais que atuam e educam-se entre si e na mediação com o mundo; b) jovem escolhe jovem demarcando que são os próprios jovens que tomam decisões relativas a processos de escolha, de representações e opções diversas; c) uma geração aprende com a outra, entendo que toda atuação social e a causa à qual ela se remete encontram-se dentro de um processo histórico. Quem embarca em algum engajamento em prol da vida, do planeta e da humanidade, sempre está, de alguma maneira, dando continuidade a um processo acumulado por diversas outras pessoas ao longo de anos. Estes novos "tripulantes" trazem consigo novas idéias, conhecimentos e percepções que inovam esse processo, enquanto os antigos possuem um acúmulo de experiências que são fundamentais, especialmente para os que cheguem não precisem "reinventar a roda".
• Articulação em rede, por meio da difusão na prática da chamada "cultura de redes", procurando conectar iniciativas com objetivos comuns e estimulando o surgimento de novas experiências em sintonia com essa perspectiva. A partir de 2003, o Brasil incentivou a articulação da Rede da Juventude pelo Meio Ambiente e Sustentabilidade - REJUMA, a qual contribuiu para alavancar outras redes, como a Rede Amazônica de Juventude pelo Meio Ambiente - RAJMA, diversas redes estaduais e locais, além de aproximações entre essas redes e as Redes de EA e de Agenda 21 em atividade no país, especialmente da Rede Brasileira de Educação Ambiental (REBEA).

Braços dados ou não....

Todas essas iniciativas reforçaram a viabilidade de sucesso na articulação de projetos de educação ambiental com segmentos de juventudes, a partir de princípios, metodologias e formas de gestão inovadoras, diferenciando-se de iniciativas em geral, que apresentam uma visão simplificada do jovem atual, escolarizada e que pouco considera a diversidade de movimentos, coletivos e organizações de juventude existentes. A partir destas experiências mencionadas foi possível identificar importantes lições aprendidas na área de juventude e meio ambiente:

1. Considerar a complexidade do mundo atual e dos temas - juventudes e EAs
2. Problematizar visões ingênuas, parciais, estereotipadas dos jovens
3. Empoderar os sujeitos jovens e suas respectivas organizações
4. Criar oportunidades e abrir perspectivas conjuntamente com os jovens envolvidos
5. Fomentar a cultura de redes na prática, estimulando ações cooperadas e o livre fluxo de informações.

Por outro lado nem todas as juventudes estão igualmente envolvidas e comprometidas com a temática ambiental no país. Há movimentos e organizações que ainda não despertaram interesse pela questão, seja por certo tradicionalismo, enrigecimento organizacional, falta de visão estratégica e análise conjuntural, seja por considerar que a questão ambiental é ainda secundária, e, portanto, menos prioritária no momento. Há outros movimentos e organizações que já atuam na área, mas muitas vezes sem saber. São aquelas que atuam em área afins - cultural, social, etc, como artistas, músicos, poetas, e diversas organizações sociais que ainda não perceberam que toda atuação social, cultural, política pode também ser ambiental.

Já, por outro lado, é crescente a articulação e o fortalecimento no Brasil de um movimento de juventude pelo meio ambiente emergente, com boa capilaridade (presente em todas as vinte e sete unidades federativas do país e suas capitais, organizadas em Coletivos Jovens de Meio Ambiente - CJs), articulando-se numa rede nacional em expansão - a REJUMA. Desde então muito se avançou na área apesar do pouco tempo (4 anos), com diversos resultados que merecem ser reconhecidos e destacados:

1. Consolidação e expansão dos Coletivos Jovens de Meio Ambiente (CJs) pelo país, ampliando-se para diversos municípios brasileiros
2. Fortalecimento da REJUMA e criação de diversas redes regionais, estaduais e locais de juventude pelo meio ambiente
3. Desenvolvimento do Projeto Geo Juvenil Brasil, sistematizando impressões de jovens envolvidos na área
4. Realização de Encontros Nacionais, Regionais e Estaduais de Juventude pelo Meio Ambiente, reunindo jovens atuantes e fortalecendo o movimento
5. Disseminação de publicações voltadas para a criação de Coletivos Jovens e de subsídios à políticas públicas na área (Manual Orientador para CJs e livro "Juventude, Cidadania e Meio Ambiente")
6. Consolidação do Conselho Nacional de Juventude, com assento da REJUMA e criação de conselhos estaduais e municipais com abertura para a área ambiental
7. Realização do Pró-Jovem, programa de formação de jovens com ensino fundamental incompleto, com alguma inserção da temática ambiental
8. Ampliação do número de organizações de, para com juventude incorporando a pauta ambiental

Todos os avanços enunciados não ignoram as muitas lacunas que se visualiza na área. Trata-se de campo novo e em emergência, carente de estudos aprofundados e dados sistematizados e com necessidade de um maior aprofundamento conceitual e temático dos jovens envolvidos, considerando:

• Maior conhecimento das leis vigentes, suas implicações, contradições e insuficiências
• Aprofundamento temático nos diversos temas da área: biodiversidade, mudanças climáticas, transgênicos, agenda 21, e diversos outros.
• Maior formação na área (continuada, a distância)
• Ampliação da articulação com diferentes setores da sociedade
• Ampliar fontes de informação (com mais qualidade), procurando contextualiza-las às diferentes realidades
• Superar visões utilitaristas, românticas e generalistas da temática ambiental ainda presentes na maioria dos jovens
• Consolidar a institucionalização das políticas na área de Juventude e Meio Ambiente - Programa Juventude e Meio Ambiente, Conferência Infanto-Juvenil, Programa

Vamos Cuidar do Brasil com as Escolas, etc - assegurando recursos humanos e orçamentários e condições político-institucionais para sua implementação.
Essas são perspectivas que se vislumbram atualmente a partir da realidade brasileira, que por sua vez, não é única nem tampouco homogênea. É provável que o Brasil possua experiências singulares nesta área, como também há certamente muitas semelhanças com outros países, especialmente da América Latina e África (relação Sul-Sul). Se em alguns destes países esta área seja ainda incipiente, em outros há iniciativas interessantes que merecem ser mais bem estudadas visando a promoção de intercâmbios e articulações regionais.

A nosso ver as iniciativas na área de Juventude e Meio Ambiente devem cada vez mais:
"ir além do conhecido jargão do ‘protagonismo juvenil’, criando espaços e oportunidades reais, e facilitando processos de reflexão sobre o papel dos seres humanos e das organizações no mundo atual. Ao entender que a questão socioambiental é por si só um convite a uma visão mais ampla da sociedade, a mesma serve como uma espécie de lente para as juventudes, na medida em que amplia concepções, expande idéias e visões de mundo, questiona e propõe novos valores, procurando perceber e integrar diferentes assuntos, questões e problemas ambientais". (BRASIL, 2006, pág. 13).


Bibliografia
BRASIL. Órgão Gestor da Política Nacional de Educação Ambiental. Ministério do Meio Ambiente. Ministério da Educação. Juventude, Cidadania e Meio Ambiente: subsídios para elaboração de políticas públicas. Brasília, UNESCO, 2006.

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